sexta-feira, 25 de janeiro de 2013

EM BUSCA DO TEMPO PERDIDO: CÉLULAS-TRONCO

Apesar de as pesquisas com células-tronco terem começado há não mais do que três anos em todo o mundo, resultados animadores já apareceram no ano passado: pesquisadores coreanos tiveram sucesso na clonagem terapêutica, células-tronco humanas embrionárias formaram neurônios em pacientes tratados com elas e o pesquisador escocês Ian Wilmut, pai da Dolly, conseguiu permissão para fazer clonagem terapêutica.
Poucas vezes a ciência avançou a passos tão largos em tão curto tempo. Com a aprovação das pesquisas com células-tronco embrionárias pela Câmara dos Deputados, no dia 2 de março de 2005, o Brasil entra na seleta lista de países do mundo que estão correndo em busca de tratamentos para doenças genéticas até hoje incuráveis e para lesões físicas ainda irreversíveis.

Para muitos pacientes, as células-tronco embrionárias representam a única esperança de vida.
Os cientistas apostam muito nessas células, porque somente elas são capazes de produzir todos os 216 tecidos do nosso corpo. Por isso, Wilmut decidiu usar a técnica de clonagem terapêutica para gerar linhagens de células-tronco embrionárias obtidas de pacientes com doenças neuromusculares graves e letais. Com elas, pretende produzir neurônios para entender por que eles morrem nesses pacientes.

Além disso, sua proposta é estudar o efeito de diferentes drogas em culturas de neurônios em vez de usar cobaias humanas. Mais do que tudo, pesquisas nessa área poderão nos ensinar como programar as células-tronco embrionárias ou como reprogramar células-tronco adultas para produzir células nervosas ou de qualquer outro tipo antes de injetá-las nos pacientes.

A esperança é que inúmeras doenças, entre elas as neuromusculares, o diabetes, o mal de Parkinson e as lesões de medula possam ser tratadas pela substituição ou correção de células ou tecidos defeituosos. A terapia celular com células-tronco pode significar também grande avanço para as técnicas de transplante de órgãos que conhecemos hoje. Se as pesquisas derem os resultados esperados, no futuro, será possível fabricar tecidos e órgãos em quantidade suficiente para suprir toda a demanda e acabar com as longas filas para o transplante de órgãos. Do mesmo modo que trocamos peças do nosso carro, poderemos substituir órgãos com defeito ou corrigir sua função. Mas, para chegar lá ainda temos que pesquisar e estudar muito.

Pesquisas com células-tronco adultas já foram iniciadas em pacientes cardíacos (a maior pesquisa do mundo com esses pacientes está sendo feita no Brasil com 1200 pessoas) e em doenças como esclerose múltipla, acidente vascular e diabetes. No entanto, essas células apresentam algumas limitações. Por enquanto, não podem ser transformadas em todos os tecidos do corpo, mas somente em alguns, em especial naqueles em que estão presentes, como é o caso da medula óssea, que produz glóbulos brancos, vermelhos e plaquetas, os componentes básicos do sangue.

No momento, podemos dizer que a terapia com células-tronco adultas tem mostrado bons resultados no tratamento de leucemia. Essas células têm sido retiradas da medula óssea e, mais recentemente, do cordão umbilical e da placenta, e depois transplantadas nos pacientes a partir de doadores compatíveis.
Outra técnica utilizada, ainda experimentalmente, é a de autotransplante, que consiste na retirada de células-tronco que serão reinjetadas no próprio paciente para o tratamento de lesões cardíacas e na recuperação do tecido nervoso de pessoas que sofreram acidentes vasculares. Ninguém sabe ainda se esse tratamento é eficiente; por enquanto é uma tentativa válida de terapêutica experimental. A má notícia a respeito do autotransplante é que não resolve o problema dos mais de 5 milhões de brasileiros portadores de doenças genéticas, porque o defeito está presente em todas as suas células. Essas pessoas precisam receber células-tronco embrionárias.

Alguns grupos religiosos se opõem ao uso de células-tronco embrionárias obtidas em embriões congelados porque acreditam que o processo equivale a um aborto. Não é verdade. No aborto provocado, a vida do feto é interrompida dentro do útero da mãe. No caso de embriões congelados, produzidos por reprodução assistida, o embrião foi feito em um tubo de ensaio nas clínicas de fertilização e o potencial de vida não existe enquanto não for introduzido dentro do útero. Na prática, esses embriões, que ficam congelados por anos, tornam-se inviáveis e são descartados.

Outro argumento religioso é que utilizar células-tronco embrionárias para pesquisa é o mesmo que matar o embrião, pois a vida se inicia no momento da fecundação. Novamente, não é. Embora não haja consenso sobre quando a vida começa, todos concordam, inclusive os religiosos, que ela termina quando pára a atividade cerebral. Por que não adotar o mesmo critério para considerar que o início da vida coincide com o aparecimento dos primeiros vestígios de terminações nervosas, ou seja, no 14º dia após a fertilização e não no quinto dia, data em que geralmente os embriões são congelados?
Aprovando a pesquisa com células-tronco embrionárias, nossos parlamentares deram aos cientistas do nosso país a chance de trabalhar em prol de milhões de brasileiros que hoje têm a vida limitada por uma doença.